segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Je ne veux pas être seul


                A tarde caía ordinária, comum, infame.
                Nada fugia do normal a não ser aquele casal de jovens apaixonados.
                Esses jovens que são tão puramente ensinados a amar, mas enganados profundamente quanto ao término deste.
                O mar lânguido beija a areia com uma volúpia incessante, as ondas selam a promessa de amor entre a natureza, tão simples, tão rebelde, tão certa.
                Nada mais que algumas luzes impostas pelo homem afim de quebrar o encanto do cenário é existente.
                A lua rente ao seu reflexo disforme no mar, é testemunha.
                Devastação é a palavra.
                Beijos lentos, alvoroçados, quentes e mornos são trocados.
                Línguas cegas que se reconhecem pelo tato, assim como veludo molhado, se explorando sem reservas.
                Mãos desprovidas de pudores que sentem cada célula do corpo a sua frente, elas admiram a temperatura, a maciez, trocam carícias lentas e esbaforidas que são capazes de durar uma noite toda.
                Corpos que protegidos por poucos panos, se misturam em uma sensação única de sentidos. Tudo se vê. Tudo se prova. Tudo se cheira. Tudo se sente.
                A linguagem corporal é empírica e universal. Nem sempre se está na mesma sintonia, mas mesmo assim se é entendida.
                Neste belo palco banhado pelas estrelas, duas almas se consomem como nunca.
                E assim que toda a euforia de corpos se acalma, assim que os braços e pele terminam suas descobertas, assim que os dedos decoram cada célula como se fosse a ultima vez, a garota suspira.
                – Eu queria poder sempre lembrar nós dois assim. Sem desgastes, sem momentos ruins. Só nós dois e a maneira que nos encaixamos perfeitamente – suas palavras flutuavam sonhadoramente.
                – Mas você vai... Ao menos eu irei e não vejo motivos para ser diferente – o rapaz respondeu com um sorriso.
                Ela balançara a cabeça energicamente.
                – As coisas não vão ser sempre tão fáceis – seus olhos castanhos brilhavam – Você vai acordar um dia e perceber que isso não é o que você quer. Todo mundo enjoa, eu vou e você também vai.
                O rapaz sorri diante a insegurança da garota e deixa seu nariz passear por toda a pele branca de seu pescoço, absorvendo o cheiro de frésias e suor que ele tanto gosta. É impossível enjoar disto, de seu corpo, de seu jeito espontâneo e espevitado.
                Ela era feita especialmente para ele.
                – Impossível – murmurou em sua pele doce.
                – Faremos um trato então? – propôs a garota ansiosa – Quando percebemos que mesmice nos atingiu, quando houver menos sexo e mais discussões, quando minhas vontades e ambições te fazer desistir das suas, nós acabaremos. Sem grandes palavrões ou cenas elaboradas. Teremos a nossa ultima noite, tarde ou dia e deixaremos as boas memórias reinarem em nossas mentes. Sem ter que lidar com a frieza um do outro, sem ter comparações de como era e do que se tornou. Só cultivar o que é bom. E quando a saudade bater poderemos voltar a esta noite, relembrar como tudo era bom e como estávamos apaixonados e logo em seguida as coisas melhoraram. O que me diz? É uma boa saída.
                As mãos do rapaz deslizavam suavemente por suas costas, desenhando formas cegas e rítmicas, o silêncio era tudo que se podia ouvir naquele instante, assim como o barulho incessante do mar.
                – Temos um trato – Ela podia ouvir o sorriso em sua voz – Não que eu pense que acontecerá, pelo contrário, mas é porque mesmo que você se torne uma velhinha ranzinza eu ainda não acho que deixarei de me surpreender contigo e com esse teu jeito de nos arranjar tudo que falta. Porque eu só era um cara ferrado e você me deu expectativas. Nada me fará esquecer o brilho que surgiu nos meus olhos, muito menos a pessoa responsável. E já lhe digo que só coisas boas me atingiram quando minha mente vagar pra perto de ti. É inevitável. Então mesmo este trato sendo fadado ao fracasso, eu concordo.
                E ali naquela paisagem magnífica, um acordo estava feito.
                Quisera a vida fosse fácil assim, quisera o amor que as pessoas não fossem tão suscetíveis às mudanças.
                Quisera eu que este fosse o ponto final de uma bela história de amor, fadada ao clichê do fracasso. 

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Faire rage



I'm a mountain that has been moved
I'm a river that is all dried up
I'm an ocean nothing floats on
I'm a sky that nothing wants to fly in
Me pego diversas vezes divagando sobre o que tenho vivido.
Não sei se decido por chorar ou rir.
Era suposto as adversidades me fazerem forte, as tempestades me mostrarem o quanto sou corajosa e digna de ver o sol surgir dentre as nuvens.
Mas e quando a tempestade não passa?
Afogo-me constantemente nas vielas desse vale inóspito que é a minha mente e meu coração, será que sou digna? Onde está meu sol?
Porque só me dão chuva, enquanto peço calor?
Porque sou servida de solidão, se tudo o que eu fiz foi pedir amor?

I'm a sun that doesn't burn hot
I'm a moon that never shows it's face
I'm a mouth that doesn't smile
I'm a word that no one ever wants to say...
Deus, eu nunca quis dar a ninguém o passe livre para o meu mundo.
É só um ticket de visitação. Não é moradia fixa.
Então porque sou invadida? Porque violam a minha tênue linha de existência enquanto tudo o que eu faço é seguir na escuridão?
As trovoadas são tão fortes aqui. Meus dedos estão congelando e tudo o que eu queria era ter você para beijá-los com a ternura que sempre fazia.
Mas você se perdeu por estas ruelas, escondido, onde ninguém pode te ver.

I'm a mountain that has been moved
I'm a fugitive that has no legs to run
I'm a preacher with no pulpit
Spewing a sermon that goes on and on...
Será que vale a pena deixar as veias se intoxicarem?
A química aspirada não resolve mais nada.
Fico trancada na minha concha, no meu casulo, na minha dor.
Ela me era tão conveniente que ao perdê-la, me deixei ser guiada por ninguém.
“Eles mentem” Ela recitava “Eles ferem” Soltava seu ácido “Feche suas lacunas” Corroía-me “Não demonstre” Me oprimia.
As palavras soam tão desconexas, sem valor, evasivas, aterrorizadoras. Tão parecidas comigo.
Sim, porque definitivamente eu sou o que eu sinto e não o que os outros veem.

Oh, chuva escorre pela janela e me leva com você, porque já não aguento mais tanta solidão.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

If I'm lost please (don't) find me



               We don't sleep when the sun goes down.
                É engraçado como os anos passam.
                Tudo é reluzente como ouro, mas ainda não se aprende que as aparências enganam.
                As luzes coloridas piscam ritmicamente, o som ecoa alto. Não se pode ver a diferença no mar de rostos ao redor e as mãos continuam frenéticas por todo o corpo, o sangue pulsa alto o suor exala pelos poros.
                O mundo passa a ser um lugar melhor.
                É momentâneo, intenso, abrasador.
                Não é preciso rótulos, status social, raça ou opção sexual. É uma massa uniforme, se movendo junto, ao ritmo da musica que ecoa na alma.
                A noite fria acolhe os corações cansados e desesperados por alguma emoção. É preciso sentir. Sangrar. Correr. Deixar a adrenalina entorpecer os sentidos. O coração acelerar até explodir no peito.

                We don't waste no precious time.
                Não há relógios, não há compromissos.
                A fórmula mágica circula pelo sistema, agride a massa cinzenta, não te deixa pensar, paralisa o córtex.
                É um contato direto com a alma, olhando no fundo de suas vontades, ignorando o superego e chegando às profundidades do ID. É carnal, segue o instinto mais animal.
                Não tem sociedade. Não tem a fodida realidade. Não existe espaço nem limite de tempo. É só você. Só sua alegria. Seu profundo contentamento.

    All my friends in the loop, making up for teenage crime.
                Apazigua a secura com a água, morda seus lábios.
                Extravase tudo.
                A semana fodida que se passou, o pai desatento, a mãe alcoólatra, o chefe tarado pronto para te devorar, seus medos, suas inseguranças.
                Deixe que saia pelos poros, que refresque a consciência defeituosa, que desiniba a libido. Deixe que as roupas caiam assim como as memórias ruins, deixe que as amarguras se quebrem como as garrafas no chão.
                Não tente enxergar tabus, estes velhos conhecidos sempre te pressionam por coisas certas.
                Essa é a sua válvula de escape, seu poder.
                É você saindo do banco de passageiro e assumindo pela primeira vez a direção da sua vida.
                Mas infelizmente o passeio é curto.
                Tudo reluz por doze horas seguidas, mas não é ouro.
                É utopia.
                É ilusão.
                A noite aconchegante vai cedendo seu espaço para o dia repugnante.
                Verdades são expostas, tudo queima, tudo corrói.
                E assim que se acorda com a cabeça latejando e em um lugar derradeiramente estranho, a maldita existência efetiva vem arrombando a porta.
                O efeito passou, a dignidade acabou e agonia é cada vez mais aterrorizadora.
                Mas é tempo de acordar.

                Go, go away...
                – ainda é cedo demais pra acabar.
                – O efeito é curto linda, assim como tudo na vida, você não pode ter aquilo que quer sempre.
                Go, go away.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

Desconstruindo

– Por que você tá chorando mãe?  
– Nada minha filha, é a vida.
A pequena garota abraçava sua mãe com ímpeto, ela era tão pequenina.
Tão frágil.
Mas não tão frágil quanto a sanidade de sua mãe, que aos prantos tentava acender um cigarro sem se dar conta que a pequena odiava-o.
– Odeio essa coisa – ela resmungou – Você ainda não me disse mãe, o que a vida te fez?
– Ela colocou essa coisa horrível que é o seu pai na minha frente, o ódio, a traição...
– Ai mãe, mais você disse que nos amava mais que tudo.
A mãe acariciou a cabeça revestida de cachos loiros da filha, a cara do pai endiabrado.
Ela era linda.
– Eu amo você mais que tudo nesse mundo, meu leãozinho – ela sorriu enquanto lágrimas caiam por todo o seu rosto borrado – Amo tanto você que se pudesse voltar no tempo, eu nem teria deixado você nascer.
– Mas mãe! – os pequenos olhos verdes encheram-se d’água.
– Eu te deixaria dentro de mim, onde eu posso cuidar e zelar por você – o rosto franzino beirava a insanidade – E não nesse mundo de merda, onde qualquer cara barbudo possa te tocar, quebrar teu coração, fazer você chorar.
Os pequeninos olhos verdes brilhavam ainda mais.
– Você não queria que eu nascesse? É isso mãe?
O verde jade encarava os castanhos derretidos procurando por compreensão, mas só achara o vazio.
– Quando você crescer meu bebê, você vai me entender. Você vai.
Os pequenos olhos verdes maduraram, aos poucos os cachos foram sumindo, o corpo aparecendo, a inocência esvaecendo. 
Passara sua adolescência em meio à rebeldia, entre traumas, palavrões, discórdia.
Não passava.
Seu longo cabelo loiro virou uma um reboliço laranja, suas roupas antes tão alinhadas e caras passaram agora para panos escuros.
A voz de sua mãe ecoava por sua cabeça.
Fechou-se de tal maneira que parecia ser irreversível, amadureceu tão cedo.
Mas as coisas não precisavam ser assim, não.
Ele veio com seus cabelos negros, sua pele pálida, seu sorriso tímido.
Doce. Ela o deixou entrar.
Despejou seus segredos, seus temores, sua vida.
 – Eu queria que tudo isso durasse mais – comentou melancólica.
– Mas vai durar – o rapaz lhe abraçou.
– Não vai – balançou a cabeça energicamente – Você vai me deixar assim como todo mundo, eu sou complicada demais. Estranha demais. Na verdade, se fosse por minha própria mãe eu nem teria nascido.
– Esqueça o passado e viva! Não se baseie nos erros dos seus pais amor e nem tente adivinhar o que vem pela frente porque o que for pra ser, vai ser.
Ele a deixou. É. No fim das contas não era para ser.
Enquanto ela tomava uma dose pura de Grey Goose e fumava os tão odiados cigarros, ela conseguiu ver sentido naquilo que sua mãe lhe falara.
E mais do que tudo no mundo desejou voltar à placenta. Para o único tipo de amor que não machuca.
O maternal.
– Eu amo você, mamãe.

domingo, 20 de março de 2011

Last reason

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Na busca pelo perfeito, me decepcionei.
Corri tanto atrás, tentei fazer acontecer e de nada me adiantou.
Passei meses idealizando pessoas, criando situações imaginárias.
Olhei dentro de seus olhos tentando achar algo que me completasse o vazio.
Rondei por aí, passei por essas ruas entre poças e carros sem rumo algum.
Solidão era minha fiel companheira, sentia falta de coisas que jamais havia vivido.
Vaguei em uma multidão de almas perdidas procurando meu encaixe e nunca encontrei.
Não cogitava a idéia de uma felicidade alternativa, jamais.
Chorei, chafurdei-me em uma pilha de dores e agonias, sempre em silêncio.
Minha alma gritava cobrando-me pelo vazio, eu mal abria minha boca.
As olheiras começaram a se pronunciar em meu rosto, passei a evitar espelhos.
Passei alguns anos procurando, beijando bocas aleatórias, experimentando sensações.
O vazio não ia embora.
A dor continuava.
Meu corpo, minha alma, meu coração.
Tudo parecia ser irremediavelmente quebrado, desisti.
Joguei tudo para o alto, gritei, chorei mais do que meus olhos podiam suportar, esperneei.
Coloquei tudo para fora e segui com minha vida.
Parei de procurar, foquei-me em objetivos que só dependiam de mim mesma.
E em um dia chuvoso, improvável e pateticamente normal eu te achei.
A outra metade que minha alma incansavelmente procurara.