sexta-feira, 8 de abril de 2011

Desconstruindo

– Por que você tá chorando mãe?  
– Nada minha filha, é a vida.
A pequena garota abraçava sua mãe com ímpeto, ela era tão pequenina.
Tão frágil.
Mas não tão frágil quanto a sanidade de sua mãe, que aos prantos tentava acender um cigarro sem se dar conta que a pequena odiava-o.
– Odeio essa coisa – ela resmungou – Você ainda não me disse mãe, o que a vida te fez?
– Ela colocou essa coisa horrível que é o seu pai na minha frente, o ódio, a traição...
– Ai mãe, mais você disse que nos amava mais que tudo.
A mãe acariciou a cabeça revestida de cachos loiros da filha, a cara do pai endiabrado.
Ela era linda.
– Eu amo você mais que tudo nesse mundo, meu leãozinho – ela sorriu enquanto lágrimas caiam por todo o seu rosto borrado – Amo tanto você que se pudesse voltar no tempo, eu nem teria deixado você nascer.
– Mas mãe! – os pequenos olhos verdes encheram-se d’água.
– Eu te deixaria dentro de mim, onde eu posso cuidar e zelar por você – o rosto franzino beirava a insanidade – E não nesse mundo de merda, onde qualquer cara barbudo possa te tocar, quebrar teu coração, fazer você chorar.
Os pequeninos olhos verdes brilhavam ainda mais.
– Você não queria que eu nascesse? É isso mãe?
O verde jade encarava os castanhos derretidos procurando por compreensão, mas só achara o vazio.
– Quando você crescer meu bebê, você vai me entender. Você vai.
Os pequenos olhos verdes maduraram, aos poucos os cachos foram sumindo, o corpo aparecendo, a inocência esvaecendo. 
Passara sua adolescência em meio à rebeldia, entre traumas, palavrões, discórdia.
Não passava.
Seu longo cabelo loiro virou uma um reboliço laranja, suas roupas antes tão alinhadas e caras passaram agora para panos escuros.
A voz de sua mãe ecoava por sua cabeça.
Fechou-se de tal maneira que parecia ser irreversível, amadureceu tão cedo.
Mas as coisas não precisavam ser assim, não.
Ele veio com seus cabelos negros, sua pele pálida, seu sorriso tímido.
Doce. Ela o deixou entrar.
Despejou seus segredos, seus temores, sua vida.
 – Eu queria que tudo isso durasse mais – comentou melancólica.
– Mas vai durar – o rapaz lhe abraçou.
– Não vai – balançou a cabeça energicamente – Você vai me deixar assim como todo mundo, eu sou complicada demais. Estranha demais. Na verdade, se fosse por minha própria mãe eu nem teria nascido.
– Esqueça o passado e viva! Não se baseie nos erros dos seus pais amor e nem tente adivinhar o que vem pela frente porque o que for pra ser, vai ser.
Ele a deixou. É. No fim das contas não era para ser.
Enquanto ela tomava uma dose pura de Grey Goose e fumava os tão odiados cigarros, ela conseguiu ver sentido naquilo que sua mãe lhe falara.
E mais do que tudo no mundo desejou voltar à placenta. Para o único tipo de amor que não machuca.
O maternal.
– Eu amo você, mamãe.

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